Guru Vani
Quinze Anos na Consciência de Krishna
Por Sua Divina Graça Srila Bhakti Sundar Govinda
Dev-Goswami Maharaj
Discípulo: Quando Srila Prabhupada veio ao Ocidente, distribuiu a consciência de Krishna de maneira muito ampla e livre. Com o passar dos anos, muitos de nós desenvolvemos o que pode ser considerado hábitos não muito bons, tais como colocar quadros de Radha-Krishna na parede sem oferecer nenhuma adoração a Eles; dizer "Haribol" sem nenhuma reverência, etc. Nós no Ocidente deveríamos agora tentar fazer alguma mudança em nossa atitude?
Srila Govinda Maharaj: Se Srila Prabhupada tivesse imediatamente dado o que desejava estabelecer no Ocidente, ninguém teria sido capaz de digerir. SrilaPrabhupada tentou distribuir a consciência de Krishna no Ocidente de modo muito amplo. Quando ele deu consciência de Krishna, ele escolheu um processo e apresentou algumas condições: "Você quer cantar Hare Krishna? Você seguirá os quatro princípios*?" E vocês responderam que: "Sim". Nisso, ele deu o mantra e instruiu que, "Você deve cantar dezesseis voltas, e deve seguir os quatro princípios. Se desejar viver uma vida de brahmachari, você pode ficar no Math, ou, se desejar, você pode ficar no Math como um grihastha (casado)."Ele também deu essa oportunidade.
Ele conhecia as atividades do Ocidente, e o caminho em que estavam indo, e o Ocidente e a Índia não são iguais. A cultura Indiana e a cultura Ocidental são muito diferentes. Na Índia, nos encontros, as mulheres sempre sentam de um lado, e os homens do outro. Mas não é assim no Ocidente. Aqui na América e na Austrália, vejo por toda parte muitas mulheres dirigindo carros —não só carros, mas também caminhões muito, muito grandes! Elas dirigem facilmente e com uma mente livre. Elas têm uma cultura em que todos respeitam a todos. Eu vi isso em especial na Austrália. Estávamos na estrada, e uma senhora ia muito veloz num carro. Apesar de ela não nos conhecer, e não a conhecermos, ainda assim ela nos deu alguma atenção e ofereceu algum respeito.Mas o fato é que as culturas e também os estilos de vida da Índia e dos Estados Unidos não são iguais. Prabhupada considerou: "Se eu tentar apresentar a eles a maneira indiana, não serão capazes de aceitar". Assim, ele deu algum método no qual você tem que seguir quatro princípios. As quatro atividades proibidas são muito comuns por aqui. Todos ingerem bebidas alcoólicas. Talvez alguém tenha alguma doença e não beba, mas todos os demais bebem. Pai, mãe, esposa, filhos e filhas —todos bebem alguma coisa à mesa. E quanto à mistura dos sexos, todos têm liberdade e podem misturar-se quase que sem restrições. Há tanta liberdade no Ocidente, e, quando Prabhupada viu isso, ele decidiu estabelecer os quatro princípios. Ele pensou: "Se puderem seguir isso, avançarão na linha da consciência de Krishna."
No que diz respeito às dezesseis voltas, ele considerou: "Nada sabem sobre Krishna-nama, Harinama". Então, ele disse: "Vocês primeiro pratiquem o cantar de Hare Krishna Hare Krishna Krishna Krishna Hare Hare Hare Rama Hare Rama Rama Rama Hare Hare. Pratiquem! Pratiquem! Assim, vocês entenderão o que se encontra por trás desse cantar."
A primeira vez que eu ouvi esse mantra, eu era muito pequeno, tinha apenas doze anos na época. Eu não conhecia sânscrito, mas o mantra está manifesto no idioma sânscrito. Os brahmanes podem dar mantras para meditação, mas se perguntávamos o significado do mantra, eles geralmente respondiam: "Não é preciso saber. Apenas medite no que disse a você, e o mantra revelará seu significado em seu coração". Esse era o conselho que eles davam. E isso é verdade para o mahamantra que é transcendental, e que se revelará em nossos corações.
Srila Swami Maharaj aconselhou a todos: "Deve-se cantar um mínimo de dezesseis voltas. Dessa maneira, vocês obterão o hábito de cantar. Primeiro, vocês obtêm esse hábito, nisso, sua vida de prática ficará muito fácil. Mas, quando a tendência de busca crescer em seu coração, você deverá tentar procurar saber o que acontece, e receberá ajuda dos níveis superiores. Esse é o processo principal. Prabhupada não dizia sempre tudo a todos, mas ele perguntou a todos: "Você seguirá os quatro princípios?"
"Sim, senhor."
"Você cantará Hare Krishna?"
"Sim."
"Muito bem. Então, aqui —pegue estas contas e cante dezesseis voltas diariamente."Dessa maneira, ele ocupou a todos.
Krishna é muito misericordioso. Ele não olha apenas para as atividades externas dos devotos. Krishna quer o coração do devoto. Ele quer ver se existe amor e afeto junto ao serviço a Ele. Krishna quer isso. Ele não está querendo ver se você é americano ou indiano. Krishna não quer saber onde você nasceu neste mundo. Krishna apenas quer o seu amor, sua afeição e seu apego a Ele com plena fé e sinceridade. E onde quer que Ele encontre isso, Krishna dará Sua misericórdia. Mas isso nem sempre está vindo pelo processo de prática. O processo de prática apenas nos ajudará. Se eu disser "Haribol, Haribol", alguém de fora também me verá e poderá imitar repetindo "Haribol". Dessa maneira, essa pessoa obterá algum samskara (tendência ou noção adquirida).
Não existe praticamente nenhuma comparação entre o samskara ocidental e oriental, mas você e todos tem o direito de praticar a consciência de Krishna. A consciência de Krishna fica completamente aparte de todas as culturas e costumes. Consciência de Krishna é a única necessidade das almas-jiva. Prabhupada tentou dar isso ao Ocidente. Vemos que há muitas diferenças entre as culturas indiana e ocidental.
Lembro de um devoto conectado com a consciência de Krishna há quinze anos. Ele era um discípulo de Swami Maharaj. Quando ele me encontrou em Navadwip, ele trazia com ele uma bolsa e me pediu: "Maharaj, irei a Calcutá por três ou quatro dias; posso manter minha bolsa em seu quarto?" Eu respondi: "Sim, Prabhu, você pode." Assim, ele deixou sua bolsa em meu quarto. Eu saí e não vi onde ele a pôs. Então, quando voltei, percebi que ele a tinha deixado próximo da porta. E notei que havia um par de grandes sapatos na bolsa. De repente, veio em minha mente, "Será que há algo sagrado na bolsa?" Assim, tirei os sapatos e vi o Srimad-Bhagavatam, e o Bhagavad-gita. Fiquei intrigado. Percebi a situação e me desculpei com Krishna: "Ele não sabe o que é certo e o que é errado. Por favor, perdoe suas ofensas, e perdoe a minha ofensa por não ter impedido que isso acontecesse".
Depois de quatro ou cinco dias o rapaz voltou, e eu disse a ele:"Ó Prabhu, o que você fez? Você colocou seus sapatos sobre o Bhagavatam e sobre o Gita. Isso é muito ruim". Mas ele replicou: "Não Maharaj, eu não coloquei meus sapatos em minha bolsa. Outra pessoa os colocou lá". Eu disse: "Não, Prabhu, ninguém mais vem a meu quarto, somente você veio. Ninguém toca em nada no meu quarto. Tudo é mantido aqui de maneira muito metódica. Somente eu sei onde estão as coisas, e ninguém jamais mexe em nada. Você fez isso." Mas ele fortemente negou: "Não, Maharaj, eu não poderia ter feito isso. Pratico a consciência de Krishna há quinze anos. Sei o que é certo e o que não é. Eu jamais poderia ter feito isso!" Finalmente, por ele ter tanto afeto por mim, e pensando que eu estava zangado com ele, ele começou a chorar. Enquanto ele chorava eu o abracei.
Eu disse a ele: "Prabhu, acredito que você não o tenha feito. Você está dizendo que não o fez, e eu acredito em você. Agora fique feliz! Não chore." Ouvindo isso, ele ficou muito feliz e parou de chorar. Ele então quis mostrar seu respeito e afeto por mim, e ele caiu ao chão para oferecer dandavat pranams, dandavat por inteiro. Mas naquela hora ele estava cantando em suas contas. Então, onde iria deixar as suas contas? Ele era um perito —com quinze anos na consciência de Krishna. Imediatamente, ele colocou suas contas em cima de seus sapatos! Portanto, por esse exemplo, vocês podem entender o que é samskara. Ele pôs as contas bem em cima de seus sapatos grandes, muito grandes. Ele pensou: "Este é o lugar mais alto. Se eu os puser no chão, isso será ofensivo, então é necessário encontrar algum lugar alto." Vendo que seus sapatos ficavam mais alto que o chão, ele deixou suas contas lá.
Eu disse a ele: "Ó Prabhu, o que você fez? Não faça isso". Então, ele ficou muito chateado. E ele disse, "Ó Maharaj, eu sou um mleccha. Perdoe minhas ofensas. Eu não sei o que é certo e o que é errado. Por favor, perdoe minhas ofensas."
Assim, eu novamente o abracei e disse: "Quem sou eu? Krishna certamente perdoará você. Krishna sabe o que é certo e o que não é. Você tem tanto afeto pela consciência de Krishna; essa é sua qualificação, e essa é a mais elevada qualificação. Krishna não está vendo onde você está pondo as contas de Tulasi, mas eu devo ver, porque sou aculturado pela filosofia indiana. Mas nem a filosofia indiana nem a filosofia ocidental darão a liberação e nem a devoção. A verdadeira devoção e liberação virão do coração. E esse coração você tem. Portanto, não se preocupe, Prabhu." Então, eu o abracei novamente e disse a ele um sloka das escrituras:
murkho vadati visnaya,
dhiro vadati visnave
ubhayos tu samam punyam,
bhavagrahi janarddanah
(Sri Chaitanya Bhagavata, Adi 11.108)Krishna aprecia apenas o humor de devoção e nada deste plano mundano. E há dois processos da vida de prática. Um deles tenta completamente seguir as diretivas dos Vedas, mas desconhece seu verdadeiro significado. Todas as regras, regulações e diretivas dos Vedas estão nos levando ao humor devocional. E Krishna é muito misericordioso com quem tem o humor devocional. Mas a pessoa que não tem um humor devocional pode fazer qualquer coisa, por mais santa que possa parecer, e Krishna não a reconhecerá.
Eu expliquei a ele o significado desse sloka, e ele ficou muito feliz. Eu também disse a ele: "Não faça isso de novo. É ofensivo, mas não para você. É ofensivo para mim; isto é, eu sei que não é bom. Você não sabe. Portanto, Krishna perdoará você, mas Ele não me perdoará se eu permitir. Krishna sabe que sou familiarizado e acostumado aos hábitos adequados desde minha infância, mas você não foi habituado dessa maneira. Você pensa que os sapatos estão mais acima do chão, então você colocou suas contas sobre os sapatos. Dessa maneira, você é muito inocente."
Às vezes, um neném defeca no colo da mãe enquanto ela come, mas a mãe não tira a criança de seu colo. A mãe limpa o neném e dá a ele muita atenção e nutrição. Do mesmo modo, Krishna é como nossa mãe ou pai. Krishna é sempre muito afetuoso e misericordioso. Ele tem muito amor, e nós temos pouco amor. Ele está sempre buscando pela alma-jiva e pensando, "Quando ela vai voltar para casa?"
Krishna dá às almas-jiva sua liberdade, e Ele não tomará de volta essa liberdade. Com liberdade, as jivas podem encerrar sua existência material através do Serviço Divino a Krishna. E para isso, Ele lhes dá a liberdade. Mas Ele está esperando serviço, esperando amor. Ele tem tanto amor e quer reciprocar com as almas-jiva. Portanto, Krishna não verá nenhum mal em nós. Só precisamos do desejo sincero de servir a Krishna. Então, Krishna verá somente isso.
Devemos tentar seguir algumas regulações, e isso é bom, mas não é a coisa essencial. É essencial para a paz da sociedade. Srila Guru Maharaj disse que o sistema de varnashrama é "ajuste adequado ao meio ambiente e relações harmoniosas com a natureza, conosco e com os outros". Mas mesmo se não pudermos fazer isso, se Krishna vir que temos o humor certo de devoção e serviço, Ele jamais ficará zangado ou nos jogará fora. Prabhu, esta é a resposta à sua pergunta.
fonte :
http://www.scsmathbrasil.com.br/quinzeanos.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário